sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

As mulheres do General.

Antes de começar a ler, acho que você deve se atentar a uma explicação curta aqui em cima:
esse foi o conto que enviei para o Baratos da Ribeiro na ocasião em que participei do Sarau de Prosa. A ideia desse conto é ilustrar um exemplo em que as mulheres exercem seu poder sobre homens conhecidos por não terem ninguém que exerça sobre eles poder. A teoria de que atrás de todo grande homem existe uma grande mulher, e que todo grande homem imbatível está sempre vulnerável às mulheres a quem ama.


As Mulheres do General

O cheiro de madeira queimada atiçava a fome da moça, em sua terra natal era sinal de que a refeição estava a ser servida. O céu azul estava quase limpo, o sol estava escondido atrás de uma nuvem brilhante, o que aliviava o calor do meio dia; seria perfeito para descansar a fadiga da longa viagem que terminara apenas duas horas mais cedo. Mas não havia refeição, não havia sombra de um telhado ou a maciez de almofadas. O cheiro de madeira queimada vinha junto com o cheiro do sangue sob o sol, da areia fina erguida pelo vento, e aquilo matava qualquer apetite. Sobre a colina, ela via o campo abaixo repleto de homens de armadura e longas armas nas mãos; alguns de pé, maior parte deles caídos. Dilacerados, couraças rasgadas, costelas retorcidas para dentro e para fora, sangue escurecendo a areia que cobria todo o terreno até o horizonte marcado de montanhas de pedra nua. Armas eretas fincadas em corpos, mãos erguidas em súplicas ignoradas e carros e cavalos mortos despontavam dentre a massa de cadáveres a escurecer o chão reluzente.
Para uma donzela que ainda não completara duas décadas de vida, acostumada aos hábitos domésticos, poderia ser uma contemplação desagradável e nauseante, mas não para esta moça. Os campos de batalha eram parte de seu dia, os sons de júbilo da vitória por várias vezes a despertava de manhã, e as tarefas que observava a mãe executar com esmero e amor eram limpar o sangue na armadura de seu pai e tratar suas feridas.
E ali, sentadas à entrada da tenda armada sobre a colina, cercadas de guardas por perto e cinco pelotões nos arredores, as duas mulheres tinham os olhos nas faces dos vivos que permeavam os mortos. Buscando reconhecê-lo, o homem de maior honra naquele exército que havia muito tempo saía vitorioso em cada terra que invadia. Via seus homens voltando invictos, carregando os espólios sem fazer prisioneiros. Entregavam-se a essa taciturna apreensão ao fim de cada batalha que o general começava, e quando finalmente a imagem do guerreiro surgia se aproximando da tenda, a brutalidade do bárbaro dando lugar à ternura do pai, elas suspiravam aliviadas. A mãe sempre se alvoroçava com cada ferida que o pai trazia nos braços nus ou no rosto recoberto de fúria e velhas cicatrizes; e se estivesse envenenado, e se não parasse de sangrar?
Enquanto esperavam que o general se destacasse da multidão que andava na direção da colina, o acampamento fora armado atrás desta, a mãe olhou os montes secos e feios no horizonte, depois olhou para um ponto do horizonte onde via uma fenda na muralha pela qual pouco se podia ver o verde de uma floresta.
- Para onde teu pai deseja ir? – ela perguntou.
- Ele quer fazer com que os homens das montanhas desçam todos contra ele. – respondeu a filha, escutara-o conversando com seus conselheiros alguns dias antes. – Mandou já algumas tropas para provoca-los e fazê-los descer as montanhas, não quer lutar nas encostas.
- É certo que não... estaria em desvantagem. Mas enquanto ele não tirar os olhos destes montes, vamos viver essa secura do deserto.
- Papai luta bem nas areias.
A mãe, ainda sem tirar os olhos dos vivos, soltou um som de desprezo.
- Enquanto isso vivemos neste calor terrível. Ele poderia muito bem ir logo para a passagem. Viajaríamos direto, escondidos pela mata, e logo ele conquistaria a capital.
- Ele não quer deixar nenhum inimigo às costas, mãe.
- Eu sei, mas se ele tiver as fortalezas da capital, eles não vão ser muito problema. – ela repentinamente se agitou, encontrara a imagem de seu marido começando a subir a colina logo abaixo delas. Então acrescentou. – E nós poderíamos dormir melhor e tomar um banho com ervas.
A moça ponderou. Costumava ser muito mais tolerante que a mãe, mas de fato sentia falta de um lugar fixo. Estavam tão perto do objetivo do pai, mas ele tinha planos detalhistas a cumprir.
- Então convença-o, mãe. – disse a menina. – Eu já o pedi para não nos rodear desses desprezíveis prisioneiros de guerra. Se eu quiser fazê-lo mudar de ideia outra vez tão cedo, talvez ele não queira fazer muito por mim mais tarde.
A mãe se levantou quando as fendas na armadura e as lascas perdidas na espada do general eram perfeitamente visíveis.

- Está bem... Fique longe da tenda hoje à noite.

Anderson Câmara

Fragmentos e sua primeira tiragem.

Pois é, galera...
O Fragmentos tá aí.

Além do e-book na Amazon e do físico no Clube de Autores, eu tenho agora uma tiragem particular que eu pretendo estar sempre abastecendo, o pessoal só precisa continuar pedindo. rs




E ainda gravei esse vídeo promocional. rsrs


Baratos da Ribeiro

A princípio, quero pedir perdão pelo tempo sem postar nada (como se houvesse uma legião de assíduos leitores do blog rs).

Vim falar sobre um dos sebos mais tradicionais e mais bem recomendados do Rio de Janeiro, o Baratos da Ribeiro.
Tem esse nome por ser localizado na rua Barata Ribeiro, em Copacabana, e por ter um preço baixo por livros de boa qualidade. O ambiente é aconchegante, daqueles que as prateleiras de livros te apertam dos dois lados e te chamam para inúmeras direções.


O sebo tem frequentadores carismáticos e que carregam nos olhos e nas palavras o amor pela arte, seja pela música ambiente que varia de gênero mas nunca de qualidade, seja pelas histórias de que as prateleiras são repletas, seja pela simples apreciação da vida em si.


E esses frequentadores formam o Clube da Leitura, uma roda de escritores que trazem trechos de livros e crônicas e artigos para compartilhar, e deixam no fim os contos baseados no que foi lido no encontro anterior (o mais votado).

E eu, este pequeno e desconhecido escritor, de tão feia e distante origem, tive a honra de estar presente no último Clube da Leitura que aconteceu no endereço de Copacabana, pois o Baratos da Ribeiro está migrando para Botafogo.



Você encontra o Baratos da Ribeiro na internet aqui:
E também aqui, no face...
https://www.facebook.com/pages/Baratos-da-Ribeiro-Livraria-Ltda/170107369722222