domingo, 3 de agosto de 2014

Eu e meus personagens.

Que tal falar algo sobre o processo de criação? Particularmente eu sempre achei interessante as peculiaridades de cada autor, mas aqui eu falo de algo que me foi "ensinado" e que constatei como verdadeiro depois que amadureci no processo de criação.

A princípio, peço perdão pela individualização do título. A razão disso é que narro a maneira como este autor funciona, os processos podem ser diferentes para cada um.

Não sou bom com dissertações, este blog é um refúgio para minha escrita desleixada, por isso vou direto ao assunto: eles te dominam.

Foi isso o que ouvi de uma escritora já experiente, lá nos meus longínquos (nem tanto) 17 anos. Não tinha escrito nada além de fanfics até aquele dia, e foi essa a conversa que me incentivou a criar. Eu, a princípio, achei incomum aquele conceito, e o rejeitei. Ela insistiu: "quando você começar a escrever, eles vão te dominar".
Mas como? Como algo fictício, que está se formando dentro da minha mente, pode ter mais voz que eu? Como pode um ser que nem existe ter autoridade sobre o que eu vou escrever sobre ele?
Isso me lembra um conceito novo que conheci recentemente, o de que a poesia não é visitada por nós, é a poesia que nos visita. E quando ela não está a fim, os versos saem forçados...
Você idealiza um personagem para um determinado enredo que você pretende escrever. Você "precisa", por exemplo, de um vendedor de mercearia que seja simpático com todos. Mas, quando vai escrever a primeiríssima fala do vendedor, ele diz uma arrogância. Você acha estranho, tenta apagar e reajustar, tenta fazê-lo ser gentil, mas tudo que você escreve pende para a ignorância do tal. E num momento em que você escreve sem se preocupar com ele, aí surge uma arrogância ainda maior. Você reclama, apaga, reescreve, mas o personagem bate o pé e diz: "eu sou assim!". E a partir daí, não tem mais o que fazer. O personagem já ganhou vida e tomou o controle sobre si mesmo.

Mas quem escreve sabe que isto não é exclusividade para as personagens. O enredo muitas vezes sai dos limites de nossas mãos, crescendo e se enraizando tanto que não caberia em um só volume. Isso nos leva a ponderar se o processo criativo realmente é um mérito do escritor. Não há dúvidas de que a história nasça e cresça dentro da cabeça do maluco que quer escrevê-la, mas todos concordam que é um processo praticamente autônomo. A criatividade é algo inconsciente. O escritor não procura a ideia, ela vem a ele.

Isso é defendido pelos súbitos momentos de inspiração, que já me puseram sentado dentro de uma livraria e me fizeram escrever freneticamente por meia hora me fazendo perder o ônibus para voltar pra casa, ou os conflitantes momentos de infertilidade. A disponibilidade para escrever sempre se conflita com a inspiração, e isso não acontecesse, talvez, se a criatividade fosse mais consciente... assim creio eu.

E para contradizer a mim mesmo, este processo é exercitável. Não me pergunte como, não sei como desenvolver o processo criativo. Para isto, não há manual, não há dicas... apenas a compreensão de si próprio, o que é a parte mais difícil. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário